I – Coletores e caçados

O ano era 2222, mas eles não sabiam disso. Eram um pequeno grupo isolado na floresta. Naquela noite um deles perguntava insistentemente para Dimitri a razão de algumas pessoas terem deixado o grupo na noite anterior:

_ Dimitri, por que aquelas pessoas foram embora ontem à noite?

Nem mesmo Dimitri sabia direito. Ele se lembrava apenas de uma história em que pessoas idosas deveriam deixar o grupo, pois elas estariam contaminadas por “Ele”. Ninguém lhe explicou quem era “Ele”. O certo é que todas as pessoas que fizessem trinta anos deixavam o grupo e nunca mais eram vistas. Porém nesse momento estava mais preocupado com o tempo, pois o frio reduziu drasticamente a coleta de suprimentos. Hoje não seria diferente, teriam que separar o que foi coletado, distribuir a parte de cada um e se preparar para começar tudo no dia seguinte:

_ Dimitri, eu vi um animal atacando, matando e comendo outro. Por que ele fez isso?

Isso ele sabia. Sempre soube que existem animais carnívoros, alguns chegaram até a atacá-los enquanto coletavam alimentos. Isso foi há muito tempo. Agora eles já têm o domínio do fogo e sempre quando um deles se aproxima é imediatamente repelido. Isso prejudica muito a coleta de alimentos, pois muitos membros da tribo têm que cuidar do fogo e enquanto fazem isso não conseguem recolher alimentos. Dimitri já estava se sentindo velho. Sabia que logo faria a jornada final.

Dimitri ainda esse mês faria vinte e sete anos, era o mais velho da tribo. Hoje ele estava especialmente ansioso pois havia cometido um crime. Ele saiu da floresta pela manhã e perambulou pela floresta de pedra, mesmo sabendo que era proibido ir lá.

II – Solidão e demência

A cada nascer do Sol Vladimir fazia um traço na parede com a sua pequena faca de caçador. Cada vez que ele fazia isso ele amaldiçoava os homens, Ele os culpava por sua má sorte. Sua rotina era sempre a mesma, ele verificava se havia água suficiente, vestia sua roupa especial e caminhava até um dos muitos mercados vazios. Ele sabia que tinha suprimentos para muitos anos, porém não aguentava mais viver isolado. Ele notou que era o único que saia de dia. Nas noites ele escutava barulhos aterradores. Na primeira noite, após ter enterrado a última vítima da peste, ele resolveu olhar pela janela. Lá fora passavam pessoas montadas em animais gigantescos, homens e cavalos com mais de três metros de altura. Na segunda ele não teve coragem, pois a multidão que passava gritava “morte, morte, morte”. Vladimir sabia que iria morrer, mas não seria morto por eles. Essa noite ele colocaria fogo na casa. Antes resolveu deixar mais um registro sobre tudo que sabia.

O ano era 2044. A humanidade estava enfrentando o vigésimo quarto ataque de vírus. Esses vírus vinham cada vez mais forte. Começou aniquilando os velhos e os enfermos, até que quase não restaram mais pessoas nessas condições. No próximo ataque eles vinham mais fortes e levavam sempre os mais velhos. O último deles além de matarem a grande maioria da humanidade, deixou os poucos vivos, loucos. O único que não tinha ficado louco era ele. Ele não tinha explicação para esses seres gigantes com mais de três metros de altura, pois nunca os tinha visto antes, mas isso não importava pois eles não o matariam. Finalmente terminou de registrar a sua história. O vigésimo quarto registro que fizera em hologramas; o último. O próximo passo foi colocá-los a salvo do fogo e morrer.

EPÍLOGO – Terra Arrasada

Dimitri estava com medo, porém excitado, por ter cometido um pecado. Ele se lembrou que saiu floresta pela manhã, entrou na floresta de pedra. Andou sem rumo até parar em frente a uma casa destruída pelo fogo. Ele notou também que aos seus pés havia uma caixa contendo vinte e quatro bolas coloridas. Pegou uma delas, apertou e se assustou com o holograma, pois era algo que não conhecia. Passado o susto apertou a bola novamente e o holograma falou. “No ano de 2020 sofremos a primeira pandemia de Corona Vírus…”

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